O desenrolar da história é narrado diariamente naquilo que os jornais publicam, permitindo que pesquisadores no futuro consultem minúcias de eventos. O jornalista Matías M. Molina, morto em abril aos 87 anos, fez o contrário: ele conta a história da evolução dos jornais no Brasil a partir da transformação da política e da economia.

Lançado pela editora Contexto com apoio do Núcleo Celso Pinto de Jornalismo, do Insper, que leva o nome de um dos maiores jornalistas de economia do país, morto em 2020, “História dos Jornais no Brasil (1840-1930)” é um rigoroso compêndio sobre como a imprensa se profissionalizou.

Nesta edição, Molina se concentrou sobretudo em jornais que começaram a circular no Rio de Janeiro e no Nordeste, mas um novo volume deixado pelo autor tratará de periódicos paulistas, como os centenários Folha e O Estado de S. Paulo. Em um primeiro livro, ele já percorrera os anos até 1840, da instalação da corte portuguesa no Rio ao pós Independência.

Molina descreve agora a fundação, linha editorial e desafios de publicações como O Brasil, A Noite, O Imparcial, Jornal do Commercio, Correio da Manhã, Diário de Notícias e Jornal do Brasil. As passagens ilustram a relação complexa entre a mídia e o poder, evidenciada por casos de censura, apoio governamental e campanhas políticas.

Também abordam as inovações tecnológicas e editoriais que modernizaram o jornalismo, além de perfis de jornalistas e escritores renomados que contribuíram para essas publicações.

Ao longo do tempo, a obra mostra uma notável transição de jornais marcadamente pessoais e doutrinários para empresas estruturadas e profissionais. O percurso, que abrange desde o Segundo Reinado (1840-1889) até a era digital, é um espelho das transformações sociais, políticas e econômicas do país.

No início, a imprensa era frequentemente uma “artilharia para batalhas pontuais”, diz o autor, com jornais de curta duração que defendiam ideias políticas ou interesses de seus fundadores. Figuras como Justiniano José da Rocha (1812-1862), considerado um dos maiores representantes do jornalismo do século 19, personificavam essa fase.

Seus jornais, como O Brasil e O Chronista, eram “doutrinários, concebidos como arma política de ataque e defesa”, refletindo agressividade pessoal e sua função de “órgão e alma na imprensa” do Partido Conservador, surgido em 1836. Faltava-lhes, no entanto, a solidez dos jornais informativos, que tinham vida mais longa e alcançavam público maior.

A profissionalização e a busca por uma estrutura empresarial mais sólida ganham forma com periódicos focados em notícias econômicas e preços de commodities, atendendo a uma elite de comerciantes e agricultores. O Jornal do Commercio, o Diário do Rio de Janeiro e o Diário de Pernambuco, lançados na década de 1820, são exemplos dessa influência.

A infraestrutura para o jornalismo profissional também evoluiu. A necessidade de informações durante a Guerra do Paraguai (1864-1870) e o crescimento populacional impulsionaram a demanda, levando os jornais a abandonar os prelos manuais operados por escravos para introduzir prensas metálicas a vapor.

O advento do telégrafo submarino e de agências de notícias como a Havas-Reuter no final do século 19 revolucionaria a obtenção de notícias internacionais, que antes chegavam muito atrasadas via navios.

No Brasil, a implantação do Correio público, da rede ferroviária e da navegação a vapor ampliou o alcance dos jornais e o número de leitores, acelerando a sedimentação do jornalismo profissional de hoje em dia.

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