Às vésperas de deixar a presidência do STF (Supremo Tribunal Federal), o ministro Luís Roberto Barroso disse nesta sexta-feira (26) que não pensa em deixar o Brasil e que recebeu convites de instituições acadêmicas dos Estados Unidos para passar uma temporada fora.

Em julho, o governo Donald Trump anunciou a proibição da entrada nos EUA de ministros do Supremo considerados “aliados” de Alexandre de Moraes. Barroso é um dos que teria tido o visto revogado.

Questionado se iria deixar o Supremo, o ministro evitou dar uma previsão sobre a saída da corte, mas disse que pretende ficar no país.

“Não estou pensando em deixar o Supremo prontamente, e muito menos eu penso em deixar o Brasil. Eu prefiro o Brasil, eu gosto mesmo do Brasil. Mas eu tinha mesmo o convite de mais uma instituição dos Estados Unidos para ir passar uma temporada lá, e eu espero isso em algum lugar do futuro”, afirmou, em conversa com jornalistas.

Lei Magnitsky

Barroso afirmou ter sido pego de surpresa com a aplicação da Lei Magnitsky contra o ministro Alexandre de Moraes. A medida impôs sanções financeiras ao magistrado e à esposa dele.

O presidente do Supremo afirma que, na origem, a Magnitsky tinha outro propósito, e avalia que a tendência é de arrefecimento das sanções.

“Eu acho que o país vai se pacificar progressivamente depois de acabarem os julgamentos de todos os grupos [da ação penal da trama golpista]. As feridas vão começar a cicatrizar. Mas eu acho que, do ponto de vista político, o núcleo crucial era o mais emblemático. Acho que agora é um pouco um desdobramento”, afirmou. A ação do chamado “núcleo crucial” da trama golpista é a que envolve o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL).

Barroso disse que conversou rapidamente com o presidente Lula (PT) na quinta-feira (25), durante a posse do novo presidente do TST (Tribunal Superior do Trabalho), Luiz Philippe Vieira de Mello Filho.

Segundo ele, o petista pareceu otimista sobre a rápida conversa que teve com o presidente do Estados Unidos, Donald Trump, na Assembleia-Geral da ONU.

“Conversei pouco mais de 30 segundos, muito brevemente, e o presidente me pareceu otimista. Otimista e cauteloso, mas me pareceu otimista, acho que sim. Talvez se tenha aberto uma janela de negociação”, disse.

Contratação de escritório de lobby

O ministro do Supremo disse ter sugerido a Lula a contratação de um escritório de lobby nos EUA para driblar as barreiras impostas pela gestão Trump contra a diplomacia brasileira.

“Eu, logo no começo, disse que a diplomacia não está conseguindo entrar, não por culpa dela, mas porque as portas estão fechadas, e eu acho que é preciso contratar um escritório de lobby. Havia muita resistência, porque no Brasil isso tem uma conotação ética negativa”, afirmou.

Barroso contou que o governo brasileiro não seguiu a sugestão. A iniciativa privada, porém, contratou escritórios e atuou para quebrar resistências do lado americano.

Como a Folha mostrou, um grupo de empresários brasileiros foi aos Estados Unidos no início de setembro para distensionar a relação diplomática entre o governo Trump e o Brasil. Joesley Batista, um dos donos da gigante de carnes JBS, foi recebido em audiência pelo próprio Trump.

Impeachment de ministro

Na conversa com os jornalistas, Barroso disse que defende uma tramitação rápida dos processos que discutem mudanças nas regras sobre impeachment de ministros do Supremo.

Uma das ações foi apresentada pelo Solidariedade, partido de Paulinho da Força, e pretende limitar à PGR (Procuradoria-Geral da República) a possibilidade de apresentar denúncias contra integrantes do tribunal no Senado.

“Nos casos de [impeachment] de presidente da República, [a regra] teve que ser consertada com o jogo já em movimento. De modo que eu acho muito bom, já que se discute e pese esta possibilidade, que as regras sejam definidas com clareza antes do jogo”, disse.

Barroso argumentou que impeachment não é “produto de prateleira para você se livrar de alguém de quem não goste politicamente” e, como definido pela Constituição, precisa ter uma fundamentação correta para ser válido.

Nesse contexto, o ministro explicou que um eventual impeachment aprovado pelo Senado pode ser derrubado pelo Supremo. “Os processos de crime de responsabilidade têm uma tipificação constitucional e uma tipificação legal. E, portanto, qualquer processo de impeachment, como todo ato no Estado Democrático de Direito, é passível de controle à luz da Constituição. E quem faz esse controle é o Supremo Tribunal Federal”, completou.

Voto impresso

Barroso disse que um dos destaques da sua atuação na corte foi ter trabalhado contra a implementação do voto impresso, ainda que a postura tenha resultado em ataques contra ele.

“Uma das coisas importantes que eu fiz, já não na Presidência, mas aqui no Supremo, foi o meu empenho em impedir o voto impresso. Embora tenha me custado um preço pessoal alto, de muito ódio, a começar pelo ex-presidente, que depois se irradiou”, disse Barroso.

Enquanto presidente do TSE (Tribunal Superior Eleitoral), em 2021 ele fez várias criticas à proposta do voto impresso e defendeu a ausência de fraudes no processo eleitoral desde 1996, quando as urnas eletrônicas começaram a ser usadas.

Para ele, a impressão do voto resultaria em fraudes, problemas na recontagem e colocaria em risco a segurança do sistema e o sigilo do voto.

De acordo com Barroso, o projeto de desacreditar o processo eleitoral, que seria importante para o sucesso da tentativa de golpe em caso de derrota eleitoral, começava com o voto impresso.

“A proposta era voto impresso com contagem pública manual. Então você imagina, primeiro, que ia ter que transportar esses votos neste país. E, segundo, se a gente está lidando com grupos radicais, foram capazes de invadir esta sala aqui do Supremo, o Congresso e o Planalto, você imagina o que não poderiam fazer nas sessões eleitorais. Portanto, eu acho que ali se jogou uma cartada decisiva na democracia brasileira”, afirmou.

Pacificação do país

Barroso disse que se lamentou pelo fato de deixar a presidência do STF sem conseguir pacificar o país, com “ainda muitos núcleos raivosos” espalhados no cenário político brasileiro.

“Eu gostaria de ter sido a pessoa que pudesse ter feito um resgate maior da civilidade no país, que é perfeitamente possível”, disse. O presidente do STF disse que os julgamentos da trama golpista e do 8 de Janeiro dificultaram a pacificação.

“Os julgamentos do 8 de Janeiro, o volume que foi, que demorou, e o julgamento do golpe dificultaram muito criar esse ambiente de total pacificação, porque quem teme ser preso está querendo briga e não pacificação. Então, eu diria que a minha única frustração foi não ter conseguido fazer a pacificação”, completou.

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