O STM (Superior Tribunal Militar) decidiu, por unanimidade, reverter a decisão de um juiz de primeira instância e determinar o recebimento da denúncia contra o coronel da reserva Rubens Pierrotti Júnior.

Pierroti foi acusado pelo Ministério Público Militar por fazer comentários críticos à cúpula do Exército. Ele se tornou réu pelos crimes militares de crítica indevida e ofensa às Forças Armadas.

O coronel foi chamado a dar entrevistas para falar do livro “Diários da Caserna: Dossiê Smart: A História que o Exército Quer Riscar”, em que acusa de corrupção a corporação e vários de seus oficiais –especialmente Hamilton Mourão, ex-vice-presidente e hoje senador (Republicanos-RS)– pela compra de um equipamento milionário.

Nas entrevistas, Pierrotti fez críticas à atuação do Exército na trama golpista e disse que o golpe de Estado liderado pelo ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) não avançou por “inépcia dos próprios militares”.

“Enxergo a atitude do comandante do Exército, do Alto Comando do Exército como uma atitude oportunista muito mais do que o que está se vendendo como legalista”, disse o coronel em um dos comentários destacados na denúncia.

Ele também fez críticas ao STM por gastar muito dinheiro e produzir pouco e disse que o Exército se tornou uma “unidade politizada” nos últimos anos.

O Ministério Público Militar concluiu que Pierrotti deveria responder pelos dois crimes porque “criticou publicamente ato de superior hierárquico, […] além de propalar fatos, que sabe ser inverídicos, ofendendo a dignidade e abalando o crédito das Forças Armadas, bem como a confiança que estas merecem do público”.

Na primeira instância, o juiz responsável por analisar o caso decidiu negar a denúncia e sequer abrir o processo contra Pierrotti. Ele justificou que o coronel deu as declarações quando estava na reserva, sem as “restrições disciplinares dos militares que estão na ativa”.

“Não alcançando as ações o status material de delito, inviável torna-se a possibilidade jurídica da demanda para o exercício da Ação Penal Militar, impõe-se o não recebimento da exordial”, disse.

O juiz usou como base para sua decisão a jurisprudência do STF (Supremo Tribunal Federal) que permite o “exercício regular do direito à crítica, que configura direta emanação da liberdade constitucional de manifestação do pensamento”.

A decisão do Superior Tribunal Militar se deu em um recurso apresentado pelo Ministério Público Militar. A decisão do juiz de primeira instância foi contrariada por unanimidade no STM, por 14 votos a zero. Não votou a ministra Maria Elizabeth Rocha, presidente do tribunal.

“Considerando que o entendimento do Superior Tribunal Militar contrariou a jurisprudência consolidada do Supremo Tribunal Federal sobre o tema —como reconhecido até mesmo no parecer que o Subprocurador Geral de Justiça Militar apresentou—, impetraremos em breve um Habeas Corpus com o objetivo de restabelecer a decisão que havia rejeitado liminarmente a acusação formulada contra o Coronel Rubens Pierrotti”, disse o advogado André Perecmanis à Folha.

O livro escrito por Pierrotti usa uma técnica conhecida como “roman à clef” (“romance com chave”, na tradução literal do francês), uma obra aparentemente ficcional que narra histórias reais trocando apenas os nomes dos personagens.

Pierrotti valeu-se do recurso para, em mais de 500 páginas, detalhar denúncias de corrupção contra o Exército e alguns oficiais, especialmente Hamilton Mourão, ex-vice-presidente e hoje senador (Republicanos-RS).

O autor, que hoje atua como advogado, acusa ex-colegas de farda de compactuarem com irregularidades na compra de um simulador de apoio de fogo da empresa espanhola Tecnobit, que custou € 13,98 milhões aos cofres públicos (cerca de R$ 32 milhões quando o contrato foi assinado, em 2010, quase R$ 83 milhões pelo câmbio atual).

O Exército e Mourão defendem o negócio e argumentam que ele trouxe economia para a corporação. O Ministério Público Militar arquivou as denúncias. Apesar de a área técnica do TCU (Tribunal de Contas da União), numa investigação de mais de três anos, ter apontado diversas irregularidades no processo, o plenário da corte arquivou o caso em 2021.


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